quarta-feira, 15 de agosto de 2007

De volta para casa



Viajava pela estrada coberta pela névoa do inverno. Odiava dias frios. Deixavam-lhe ainda mais deprimida. Já estava quase amanhecendo. Alguns raios de sol tentavam ultrapassar a neblina. Ao avistar a placa, viu que só faltavam alguns quilômetros para finalmente chegar em casa. Alívio. Sua missão estava quase cumprida. O caminho praticamente já havia sido percorrido. Só não sabia por qual caminho andava o seu coração. Este se perdera há muito tempo e ainda não sabia como voltar para casa.

Avistou a entrada da cidade. Ao seguir por aquela reta, relembrou-se dos velhos tempos em que andava por ali. O caminho envolto pelos pinheiros não mudara. Sentiu a velha sensação de que as árvores iriam lhe devorar naquela imensidão de pista. E essa reta que não acaba nunca? Ao ver a praça, dobrou a esquerda. A igrejinha já anunciava com o badalar dos sinos a missa das 6 horas. Senhoras andando com terços na mão, agasalhadas e com a bíblia debaixo do braço. Uma jovem passava com seu carrinho vendendo cafezinho, chá e chocolate quente para aquecer aquela manhã fria. Logo adiante, dobrou a direita. Aos poucos a cidade estava despertando para um novo dia. Crianças na rua caminhando em direção a escola. O moço do leite com aqueles galões recém tirados das vacas das fazendas da região, levando para a padaria para ser vendido. Até lembrou do cafezinho com o leite que bebia na casa da avó bem cedinho, com aquele pão de queijo que só ela fazia. Chegou a sentir o cheiro até. Ao avistar a mangueira, foi encostando o carro.

Abriu o portão e entrou na casa. Nada havia mudado. As roseiras que havia plantado estavam carregadas de botões de rosas. O pé de pitanga estava viçoso, lindo de dar gosto. Os vasinhos coloridos ainda enfeitavam a janela branca. Pegou a chave, abriu a porta e entrou em casa. Abriu as janelas. Automaticamente tirou o sobretudo, tirou as botas, deixou as chaves e a bolsa em cima da mesa e foi direto para o quarto. A cama ainda estava com a colcha francesa branca bordada. As cortinas de linho cor de amora balançavam levemente com o vento frio.

Deitou-se. Relembrou de todos os momentos vividos ali. Sim, foram felizes! Tempos que não voltam mais. Sempre fora assim, nostálgica.

Por muito tempo pensou aonde foi que deu errado. Cansou de buscar as respostas. Resolveu fazer o caminho inverso. Decidira voltar no intuito de juntar os traços, os laços, as lembranças, mesmo que parecesse sem sentido. Então pensava: aonde estava o seu coração? Talvez estivesse subindo as montanhas da região. Talvez estivesse sobre as nuvens, flutuando em seus delírios. Talvez estivesse enterrado sobre os calçamentos daquela cidade, esperando ser achado para reconstruir sua história. Talvez estivesse perdido lá na estação de trem, esperando a Maria-fumaça apitar, despertando a paixão vivida sobre os seus trilhos. Talvez esteja aqui do lado, nos versos do trovador da região, nas entrelinhas recitadas para as menininhas com olhos enamorados, querendo se apaixonar.

Respirou fundo. Chegou a uma conclusão. Seu coração, apesar de perdido, estava bem. Estava ainda procurando as respostas que tanto queria, porém permanecia abrindo os caminhos, aparando as arestas para voltar a trilhar o caminho que só o amor pode levar...

E assim, adormeceu em paz consigo mesma.

11 Comentários:

Blogger Aline Ribeiro disse...

Essa moça poderia ser eu :(

Linda narratriva amiga, linda d+

Bjm

15 agosto, 2007 09:54  
Blogger Anne disse...

Pois é, linda história...meu coração tb está bem, apesar de eu ainda estar procurando muitas respostas!!!
Sobre seu comentário no meu blog, sim, muitas pessoas são mais dependentes emocionalmente, mas procuro estar com pessoas pq gosto delas, por afinidades e não por PRECISAR. Acho q deve ser complicado viver assim, sofrendo quando se está só. eu, particularmente, vivo bem de qualquer forma!
Não sou nordestina, mas uso alguns termos pq tenho mtos amigos do nordeste e acho mto divertido o jeitinho deles de falar. Tem expressões que traduzem melhor o q quero dizer do que as daqui do sul, então faço uma mistureba!!!
Obrigada pela visita tb! Beijos

15 agosto, 2007 10:41  
Anonymous Anônimo disse...

O bom é que o amor pode tudo... ele mata e cura.. as vezes até ao mesmo tempo.

Beijos

15 agosto, 2007 11:25  
Blogger inutilia sapiens disse...

amo os dias frios...
principalmente acompanhado de delícias...
boa música, vinho, violão.

agradeço novamente os comentários...
meu pai compõe apenas a trilha da vida.
=)

ele toca uns instrumentos de percussão sempre que rola um samba na casa do meu tio.

exímio dançarino, o meu velho!

eu é que às vezes me meto a besta de escrever e tentar compor alguma coisa, o fracasso é quase certo!
=)

beijos.

15 agosto, 2007 11:39  
Blogger garota complexada disse...

Concordo com a Lorita, linda narrativa.
Gostei da parte da reta que não acabava mais.

15 agosto, 2007 15:57  
Blogger Carol Rodrigues disse...

Lindo Texto...Adorei o blog

16 agosto, 2007 17:05  
Anonymous Anônimo disse...

Tudo deságua no coração. O mar de tudo, da vida, de toda a água do universo, do amor, da angústia, da dúvida. Tudo para um coitado condenado ao enclausuramento, já batida a sua condenação e tudo ainda resvala nele.

Um beijo
Naeno

16 agosto, 2007 18:49  
Anonymous Anônimo disse...

"E assim, adormeceu em paz consigo mesma. "

Isso é o que realmente importa.
Bjinhos!

16 agosto, 2007 19:38  
Blogger inutilia sapiens disse...

heheheh.
me chamam às vezes de bu, bubu, essas coisinhas de família que duram a vida toda!!!
afinidades, eita coisa boa1

o prazer é todo meu dani!

beijos.

16 agosto, 2007 23:36  
Blogger Jana disse...

E o melhor é estar assim, em paz!

Beijos

17 agosto, 2007 08:31  
Blogger Vagando no Espaço disse...

Lindo seu texto!
Tocante...
Eu diria até sinetésico...
Me fez viajar; construir a cena passo-a-passo, palavra-a-palavra...
Fantástico!
Parabéns!
Abraços.

17 agosto, 2007 19:24  

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